quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

O Dia do Samba


Boa noite amigos do samba,

Agradeço ao samba pela paixão que sinto em minhas veias ao ouvir o romper de uma batucada.

O samba está na alma de quem sabe senti-lo, está no sorriso malandro do pandeirista, e aos amantes do samba, só resta se entregar ao copo e ao corpo. As noites de samba são eternas, e a roda nunca morre. E parafraseando Paulo Cesar Pinheiro: "eu quero aprender-lhe a medida, de como compõe minha vida, que é para eu compor minha morte".

Salve o samba.

Texto inicial do livro "Heranças do Samba"para compartilhar a todos amantes do samba. Feliz Dia do Samba a todos nós.

Mais do que uma arte

"'Flores em vida para Nei Lopes
Em memória de Anescarzinho do Salgueiro'

Falo do samba. Que outra forma de expressão é mais completa? O samba dialoga com a divindade, abraça o solo, envolve-se com águas, é verde antes da moda, vermelho antes da decepção, azul porque anteblue, amarelo porque dissidente, branco porque reunião, e negro porque um negro é um negro, é um negro, é um negro, negronoite, e a noite é a mãe de todos nós.

O capital não tem pátria. O samba tem: a alma, onde quer que ela esteja. Há os que se julgam remadores em direção ao futuro. Não sabem que o samba lhes esculpiu o barco. O fazer samba implica sempre ato de magia: é voltar. E como a essa esplêndida viagem se opõem o tempo e a ciência, o samba, encrenqueiro, volta para o futuro, numa reconquista do paraíso perdido, na qual temos que tomar conta de nossos ancestrais-bebês, sabendo que, em outro futuro próximo, as gerações vindouras chegarão para nos alimentar. Esse é o paradoxal ciclo aberto do samba. Porque o samba, mais que feitio de oração, nos ajuda a atravessar o vale da morte e das lágrimas, a lama da impunidade, o limbo das esperanças perdidas. O samba preside o nascimento e celebra o gurufim dos seres. Em linguagem cósmica, o samba estava na primeira explosão e estará no último gemido. Em todos os recantos onde nos expandimos ou onde nos confrangemos existe samba.

Heranças não pretende só recosturar tramas em direção as raízes, mas principalmente fazer com que as copas floridas se misturem e confraternizem, gerando a fecundação simultânea de idéias e ideais, cujas palavras alegre de desordem e de vento sejam: não confinar, não murar, não cercear. Que os vampiros enfiem as estacas vã-guardadeiras no solo crestado de suas próprias igrejinhas.

Muito se falou sobre liberdade de expressão, sobre a ação de patrulhas ideológicas e, no entanto, não apareceram os textos que deveriam denunciar os guetos-quilombos que se criaram devido ao isolamento, à sistemática descaracterização de nossa cultura, a violências de toda ordem, até que, exauridos, fomos entregues de bandeja a manifestações pretensamente modernas que visavam ao lucro selvagem, que fomentavam as falsas crises da nossa imbatível criatividade, religiosa, erótica, social, maior que uma arte. Alguns ingênuos foram cooptados, a preço de banana, por esse imediatismos de miçangas-pop, desmembrados no caos de uma oficina de desmonte que colhia talentos como se fossem peças de segunda mão. O que esses adoradores do presente ignoram é que samba cresce com a cachoeira e o monturo, o córrego e a vala, na cidade e no campo, na paz e na guerra.

Por quantas estradas e vielas passem as caravanas congratulatórias e o seus patrocinadores, o sambamaqui, como um cão, estará emboscado com criatividade de fato e de direito.

Fazer justiça ao camelo não significa limar o dromedário do circo. Macacas de auditório, sejam bem-vindas, mas não paguem mico!"

Aldir Blanc – Livro Heranças do Samba (Aldir Blanc, Hugo Sukman e Luiz Fernando Vianna) 

Nenhum comentário: